Este é o blogue de um espectáculo de teatro. É importante retê-lo porque a necessidade de o fazer se prende à utilidade particular a que se destina: na espuma dos dias o que é essencial vai-se como isso mesmo, espuma. E Letra M fala da vida, da criatura humana, porque fala da inevitabilidade do fim da vida, de como é irremediável a morte.
O espectáculo debruça-se sobre um desejo de eternidade utópico que persegue o homem desde os primórdios da razão. Mas não o faz no plano de uma ambição de rivalizar com os deuses ou com Deus. Fá-lo no plano do amor, de um desejo de viver o amor como um absoluto, de uma vontade de racionalidade fundada na fraternidade e na alegria, essas qualidades que se provam como reais e que a vida também pode conter, por estranho que o pareça nas circunstâncias actuais, imersos na destruição, na fome, na miséria e pior ainda, nos países ditos civilizados, na pior das venalidades e corrupção generalizados.
Letra M pretende fazer o que o texto que dá lugar à representação propõe: um debate de argumentos, uma luta de ideias, um combate por perspectivas válidas fundado nas possibilidades perscrutadas e válidas do humano, da humanidade livre potencial. É essa a proposta que vos fazemos: bloguem connosco sobre as matérias que a peça propõe. São vitais e mesmo vindas de um remoto 1401, altura da sua escrita, nunca gritaram tão alto as suas verdades. O que não está na ordem do dia. Falo das verdades e da Verdade, esse fenómeno que as camadas de realidade ocultam como um ouro que se não alcança. Já Brecht falava das cinco dificuldades de a dizer, à verdade, risco de vida fazê-lo, num tempo em que ela parece impossível e a mentira rende o que a verdade impede e dói, avessa ao lucro explorador e brutal.
Lucremos com as ideias que nos propõe Saaz, pensamento em acção emergindo no fogo da luta. Sigamos Saaz, esse humanista antes do tempo, desafiador do Deus único, ausência inatingível. Tentemo-las aqui, às ideias carregadas de dúvida e propósitos futuros, e a partir do modelo do diálogo, um diálogo de monólogos contrapostos.
É isso: querem contracenar connosco os vossos monólogos críticos e fraternos?


Fernando Mora Ramos


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23 de setembro de 2009

Monólogos do Lavrador 1


Destruidora encarniçada dos povos, vós que desprezais tudo o que vive, assassina de todos os homens, vós Morte, maldita sejais. Meus Deus, que o Deus vosso criador vos odeie, que a má sorte vos assombre, que sejais amaldiçoada para todo o sempre. Que o medo, o infortúnio, as lamentações vos persigam onde quer que fordes. Que o céu, a terra, o Sol, a Lua, as estrelas, o mar, os lagos, as montanhas e os prados, os vales, os abismos do Inferno, tudo o que vive, tudo o que se mexe vos seja hostil, malevolente, vos maldiga para sempre. Que sejais para sempre desterrado, ó mais grave dos Deuses, por todos os homens e todas as criaturas. Demónio obsceno! Que a vossa má memória viva e perdure até ao fim dos tempos. Que a verdade da minha queixa seja gritada por mim e por toda a humanidade contorcendo as mãos, que seja gritada a minha acusação.

Lavrador da Boémia de Johannes Von Saaz

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